Capítulo Narrativo: O Primeiro Amor de Bitiah
Era uma manhã ensolarada no Egito, e os raios do sol filtravam-se através das palmeiras, criando sombras dançantes no chão de areia dourada. Eu, Bitiah, sentava-me em um canto fresco do pátio palaciano, com um rolo de papiro aberto em meu colo. A brisa leve trazia o aroma das flores que minha mãe, a rainha, cultivava com tanto carinho. Com cada letra que escrevia, recordava as lições que aprendia com meu lecionador sobre os deuses, a história e a geografia do nosso grande Egito.
“Bitiah, você ainda sonha em ser uma sábia do Egito?” perguntou meu lecionador, o velho e sábio Horemheb, enquanto ajustava suas sandálias. Seu olhar era gentil, mas havia algo sério em sua voz.
“Sim, Horemheb. Mas não posso evitar que meus pensamentos vagueiem para outros lugares. Às vezes, imagino como é a vida fora das paredes do palácio,” respondi, um sorriso tímido se formando nos meus lábios.
“Ah, a juventude e seus devaneios! Mas lembre-se, há sabedoria até nos sonhos,” ele disse, piscando um olho.
Enquanto ele falava, minha mente se perdia em lembranças de um jovem que havia capturado meu coração: Hur. Ele era forte, destemido e tinha um riso que soava como música. Conheci-o durante uma de minhas caminhadas secretas pelo mercado de Tebas, uma aventura que eu não poderia compartilhar com ninguém no palácio.
Era um dia de mercado vibrante, e eu estava disfarçada com um véu, tentando passar despercebida. Quando nossos olhares se cruzaram pela primeira vez, meu coração disparou.
“Você está aqui sozinha?” ele perguntou, aproximando-se. O calor do seu olhar me deixou sem palavras.
“Sim, apenas explorando,” respondi timidamente, desejando que o chão se abrisse e me engolisse. “E você?”
“Eu estou aqui para buscar frutas frescas para minha família,” ele respondeu, segurando um cesto de figos maduros.
Nada mais foi dito, mas a conexão foi instantânea. Juntos, trocamos sorrisos e olhares cúmplices, e aquele breve encontro permanecerá gravado em minha memória, marcando o início do meu primeiro amor.
Com o passar dos meses, Hur e eu encontramos maneiras de nos encontrar nas sombras do palácio e entre as ruas movimentadas de Tebas. Nossos encontros eram simples, mas cheios de promessas e risadas.
“Bitiah, prometo que um dia vamos ver todos os pirâmides juntos. Você vai amar a vista do topo!” Hur exclamou em um dos nossos encontros à beira do Nilo.
“E eu prometo que vou te ensinar a fazer os melhores pães que aprendi com minha mãe!” respondi, rindo.
“Isso é um desafio? Porque estou preparado!” ele disse, com um brilho nos olhos.
Mas como todos os contos de amor, o nosso foi testado por forças além de nós. À medida que o tempo passava, o peso das responsabilidades começou a se instalar sobre meus ombros, especialmente porque meu irmãozinho, Adikam, estava em crescimento, preparado para assumir o trono um dia. Minha mãe, a rainha, sempre me lembrava da importância de ser uma princesa dedicada e obediente.
Em um dia marcado por nuvens escuras, minha mãe convocou-me para uma audiência particular. O olhar em seu rosto era sério, e eu já sabia que algo estava prestes a mudar.
“Bitiah, meu amor, precisamos conversar sobre o futuro,” disse minha mãe, sua voz suave, mas firme. “Adikam precisa de apoio. E há um jovem príncipe do reino vizinho que vem aqui para um encontro. Ele pode ser uma oportunidade de aliança para o nosso povo.”
Aquelas palavras cortaram meu coração como uma lâmina afiada. Um príncipe? Uma aliança? E o que seria de Hur?
“Mas mãe, eu...” tentei protestar, mas ela levantou a mão.
“Entenda, querida. É para o bem do Egito. Você é uma princesa, e suas responsabilidades devem sempre vir em primeiro lugar,” ela concluiu, virando-se para a janela e olhando para o horizonte.
As semanas seguintes foram uma tortura. Eu sabia que não poderia ver Hur como antes. Em cada canto do palácio, os murmúrios sobre o príncipe e a aliança ecoavam. E eu, cada vez mais, me sentia presa em uma teia de obrigações.
Certa noite, não consegui mais conter a dor que havia acumulado em meu peito. Fui até o lugar onde costumávamos nos encontrar, na beira do Nilo, sob a luz da lua que refletia nas águas tranquilas.
“Hur!” chamei, com a esperança de que ele estivesse lá.
Ele apareceu, saindo das sombras, e seu rosto iluminou-se ao me ver. “Bitiah! Eu estava preocupado. Você desapareceu.”
As lágrimas escorriam pelo meu rosto. “Eu não posso mais continuar. Minha mãe está arranjando um casamento para mim com um príncipe.”
Ele ficou em silêncio, seus olhos escurecendo com a dor das minhas palavras. “E você? O que deseja, Bitiah?”
“Eu... eu não sei. Eu só sei que você é meu primeiro amor, e isso significa tudo para mim,” eu disse, minha voz embargada.
“Então não desista de nós. O Egito não é apenas palácios e deveres. É também amor, liberdade e sonhos. Podemos encontrar um jeito,” ele respondeu, pegando minha mão com suavidade.
“E se não conseguir? E se eu tiver que deixá-lo?” perguntei, a dúvida pesando em meu coração.
“Eu vou lutar por você, Bitiah. Prometo,” ele disse, com determinação nos olhos.
Mas o destino tinha outros planos. Quando o príncipe finalmente chegou, o clima no palácio mudou. As celebrações começaram e, a cada dia, eu me via mais envolvida em rituais e obrigações que me afastavam de Hur. Ele estava lá, mas cada vez mais distante.
Na noite em que fui apresentada ao príncipe, vesti um lindo vestido de seda dourada que minha mãe havia escolhido. Olhei-me no espelho e, embora parecesse uma princesa, sentia-me uma estranha em minha própria pele. Durante o banquete, os olhares se cruzaram e, em meio à música e ao riso, vi Hur à distância, seu olhar triste deslizando pelo salão.
“Você é uma bela princesa, Bitiah,” disse o príncipe, puxando-me para dançar. A música soou, e enquanto rodopiava em seus braços, meu coração clamava por Hur.
“E você, um príncipe gentil,” respondi, tentando manter a compostura.
Mas enquanto dançava, uma parte de mim ansiava por libertar-se. No brilho dos candelabros, lembrei-me da promessa de Hur: “Não desista de nós.” E, de repente, tudo o que eu queria era correr para ele.
Naquela noite, fui até o Nilo novamente, em busca de respostas e de coragem. Enquanto as águas brilhavam sob a luz da lua, eu sabia que tinha que fazer uma escolha.
“Hur!” gritei, minha voz quebrando a tranquilidade da noite.
Ele surgiu como um espírito, apressado, e seus olhos brilharam ao me ver. “Você está aqui! O que aconteceu?”
“Aconteceu que conheci o príncipe e... e não sei o que fazer,” eu disse, envolvendo meus braços ao redor de mim mesma, tremendo.
“Não deixe que ninguém decida por você, Bitiah. Seu coração sabe o caminho. Se você me ama, lute por nós!” ele exclamou, a animação em sua voz aquecendo meu ser.
“Eu vou lutar, Hur. Eu prometo,” declarei, sentindo a força de seu amor revitalizar o que havia pensado estar perdido.
E assim, enquanto o Nilo fluía suavemente, eu soube que o amor verdadeiro nunca se desvanece. Ele luta, resiste e, acima de tudo, espera.
Nosso futuro ainda estava incerto, mas um novo amanhecer surgia no horizonte. E enquanto o sol começava a brilhar no céu do Egito, eu estava pronta para lutar pela minha felicidade, pela verdadeira essência do meu primeiro amor.